Verdades apresentadas em metáforas

                                                                                                                                            Por Ed Kivitz

 Qualquer mente razoável é capaz de discernir que as verdades espirituais expressas na Bíblia Sagrada são apresentadas na forma de metáforas. Ou você acredita mesmo que o céu é um lugar com ruas de ouro e peças cravejadas de diamantes, e que no céu todo mundo vai ter uma coroa descansando numa almofada vermelha exposta na sala de jantar? 

Para falar da salvação, a Bíblia usa diversas metáforas apontando para várias categorias de linguagem. Na linguagem econômica, Deus é um senhor de escravos; na jurídica, Deus é o juiz que preside o tribunal em que comparecem o réu pecador, o acusador e o advogado de defesa; na agrícola, Deus é o agricultor, seu Filho a videira verdadeira, e os homens ramos da videira; na militar, Deus é um general de exército em guerra santa; na religiosa, Jesus é ao mesmo tempo sacerdote e sacrifício; e na familiar, Deus é o Pai que tem um Filho unigênito e muitos filhos por adoção. Para falar do que hoje entendemos ser o inferno, Jesus se vale da figura do Geena, o vale de Hinom, mais precisamente o lixão de Jerusalém, que consumia no fogo de enxofre cadáveres dos indigentes, restos de animais, e todo tipo de detrito imundo.

Para além das metáforas bíblicas a respeito da salvação, a que me faz mais sentido é a relação Pai e Filho/filhos entre Deus e os homens. Quando penso em ser salvo por Jesus não tenho de imediato a imagem de um Deus irado, ou um juiz prestes a bater o martelo após um veredicto de condenação, nem tampouco me imagino sendo resgatado de um monturo de lixo que arde em fogo perpétuo. A primeira coisa que me vem à mente é a figura de dois seres humanos: Adão e Jesus de Nazaré, o Cristo de Deus. Ao falar sobre perdição e salvação, a Bíblia fala, por exemplo, de morte e vida, trevas e luz, inimizade e reconciliação. 

Adão aponta para o humano que ao comer da árvore do conhecimento do bem e do mal está dizendo a Deus: seja feita a minha vontade acima de todas as vontades – um ego com pretensões de ser absoluto. Jesus de Nazaré é o homem que se ajoelha diante de seu Pai Celestial de diz: seja feita a tua vontade, assim na terra como no céu – um ego em absoluta submissão ao Pai, obediente até a morte e morte de cruz. 

 Creio que o propósito eterno de Deus é formar uma humanidade à imagem seu do Filho, para que Jesus, o Cristo, seja não apenas o unigênito [João 3.16], mas também o primogênito dentre muitos irmãos [Romanos 8.28-30]. Percebo claramente a Bíblia ensinando que há dois paradigmas de humanidade, a saber, Adão e Cristo: “o primeiro homem, Adão, foi feito em alma vivente; o último Adão em espírito vivificante. Mas não é primeiro o espiritual, senão o natural; depois o espiritual. O primeiro homem, da terra, é terreno; o segundo homem, o Senhor, é do céu. Qual o terreno, tais são também os terrestres; e, qual o celestial, tais também os celestiais. E, assim como trouxemos a imagem do terreno, assim traremos também a imagem do celestial” [1Coríntios 15.45-49]. 

 A teologia do Ocidente, desde Tertuliano e Agostinho, confirmada pela Reforma protestante, fez prevalecer a perspectiva juridicista – justificação pela fé. Por essa razão, respeito todos aqueles que escolhem pregar o evangelho carregando a tinta nos conceitos “ira de Deus – condenação – perdição eterna” em oposição à “graça de Deus – redenção – céu”. 

 A teologia do Oriente, desde o século II, enfatiza a salvação como theosis ou deificação – a participação humana na natureza divina [2Pedro 1.4]: “Deus se fez homem a fim de que o homem se torne Deus” [Irineu de Lyon], pois “o Verbo e Filho de Deus que se uniu à carne, torna-se carne, homem perfeito, a fim de que os homens se unissem num só Espírito. Ele é então Deus que porta a carne e nós, os homens, aqueles que portam o Espírito” [Atanásio de Alexandria]. 

 O grande problema do homem é ele mesmo: Adão. A salvação de Deus é oferta da graça no seu Cristo, que nos torna participantes da natureza divina – theosis/deificação, de modo que, como ensinaram os pais orientais, “o homem se torna pela graça aquilo que Deus é por natureza”. 

 Ed René Kivitz é mestre em Ciências da Religião pela Universidade Metodista de São Paulo, escritor, conferencista e pastor da Igreja Batista de Água Branca, na Zona Oeste de São Paulo, tendo obras e pastorais publicados neste site: http://edrenekivitz.com/blog/ .

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